EM ENTREVISTA AO ME, EX-JOGADORA FALA TAMBÉM SOBRE
TRABALHO ATUAL NA CIDADE DE SOROCABA
Por Daniel Nápoli
Uma
das jogadoras que marcou época no basquete feminino, Vânia Hernandes concedeu
uma entrevista ao Momento do Esporte, recordando sua trajetória na modalidade e
também falando sobre seus projetos mais recentes.
Filha
do ex-jogador de futebol Roberto Hernandes, com passagens por Corinthians e
Bragantino, Vânia, que possui uma irmã gêmea, Vanira, que também brilhou no
basquete com passagem vitoriosa por clubes e Seleção Brasileira inicia a
conversa falando como surgiu o seu amor
pela modalidade.
Início
“Eu
desde pequena acompanhava o meu pai, o via envolvido no esporte e isso de certa
forma despertou a paixão pelo esporte em si. Na Educação Física, isso lá em
1975, 1976 eu estudava no Colégio Eduardo Prado, em São Paulo, com a Vanira e
mais dois irmãos (Dagmar de Cássia e Vicente Roberto) e como todo aluno do Ensino Fundamental, nós
fazíamos Educação Física e naquela época era muito rica, você desenvolvia muito
as suas potencialidades através dos jogos, das brincadeiras. Os esportes eram
ministrados de maneira bem interessante, bem motivadora e passei por todas as
modalidades esportivas e o que me despertou foi o que eu achava mais difícil
pelo desafio de colocar aquela bola na cesta, achava aquilo bem complexo”.
A
ex-jogadora que atuava como pivô, prossegue. “Fomos praticando todos os
esportes e um dia a nossa professora de educação física disse que queria que a
Vanira e eu nos inscrevêssemos no basquetebol , pois via na gente o potencial.
E como a gente gostava de jogar, acabamos indo jogar e deu certo. Tanto deu
certo que a professora chamou nossos pais e disse que tínhamos futuro no
basquete. Antigamente era muito difícil, não tinham essas leis de incentivo,
era mais difícil. Fomos’ batendo de porta em porta’, insistimos”.
A
insistência, de acordo com Vânia, prosseguiu. “Quanto mais as portas se
fechavam, mais aquilo se tornava um desafio. A gente queria jogar basquete e
foi daí que surgiu a ideia de ir atrás de um clube, ir atrás de um técnico,
perguntar e tudo conspirou a nosso favor, tinha uma tia (Olga) que trabalhava
com uma moça em São Paulo e essa senhora era mãe de uma jogadora do Thomas
Mazzoni (Clube), na Vila Maria. Nós fomos até lá do Brás até a Vila Maria, mais
de 1h30 de caminhada. O técnico Airton
Pereira Bueno (técnico de lá) estava como auxiliar técnico da Seleção, treinando
em Santos. Voltamos pra casa e uma vizinha se ofereceu para irmos a Santos e
foi o que aconteceu.”
Clubes e títulos
Após
a viagem, toda a luta por uma chance, foi recompensada, segundo Vânia. “Chegamos
à praia, encontramos o hotel (em que a seleção estava). Encontramos lá a Cristina Punko (ex-jogadora) que foi muito gentil, chamou o Airton ele veio conversar
com a gente e a partir daí começamos no Centro Olímpico de Treinamento e
Pesquisa e lá jogamos 2 anos, começamos a parecer no esporte, fomos campeãs
infantis e juvenis, batendo grandes equipes e daí nós acabamos nos mudando da
Vila Maria, passamos para o Clube de Regatas Higienópolis em Catanduva e fomos
no Bauru Tênis Clube, na Prudentina de 1984 a 1986 e daí fui para UNIMEP
Piracicaba e a Vanira para a Minercal (Sorocaba)”.
A
ex-jogadora falou também sobre outros clubes que defendeu. “Fomos passando por
grandes clubes no nosso auge de carreira, joguei depois em Sorocaba, joguei em
Santo André, passei pelos principais clubes do basquete feminino do Brasil,
joguei na Ulbra, mais no fim da minha carreira, uma temporada do Campeonato
Brasileiro, joguei no Sport Club do Recife, que montou uma super equipe”.
Por
clubes, Vânia que encerrou sua carreira pela equipe Quaker/Campinas, no ano 2000, teve entre seus principais títulos o Mundial (1991), a Taça
Brasil (1984, 1991-1992 e 1992) e o Paulista (1986, 1999, 1991 e 1995).
Seleção Brasileira
Não
só pelos clubes que Vânia teve passagem vitoriosa. Pela Seleção Brasileira, foi
medalha de ouro dos Jogos Pan-Americanos,em Havana-1991(foto), tendo sido prata
quatro anos antes, em Indianápolis.
Ainda
pela Seleção Adulta, foi vencedora da Copa América em 1989 e disputou os Jogos
Olímpicos de Barcelona-1992. Ao Momento do Esporte, a ex-pivô comenta sobre sua
trajetória.
“Já
havia sido convocada quando ainda estava na categoria juvenil, isso lá em 1980
e na verdade eu queria jogar a minha categoria juvenil e não já ingressar numa
categoria adulta. Resolvi ficar e não pedir nenhum tipo de dispensa em 1984 no
Pré-Olímpico em Cuba. Antes disso fomos (Vanira e ela) para a seleção juvenil
desde 1979, no sul-americano juvenil. Joguei até as Olimpíadas de Barcelona em
1992, depois disso eu torci o joelho e o meu ciclo encerrou “.
A
ex-atleta explica ainda que não foi apenas a lesão que fez com que seu ciclo se
encerrasse no selecionado. “Não foi só por isso, eu jogava de pivô e era um
pivô baixo, 1,80 m de altura. As outras atletas ao redor do mundo foram
aumentando e realmente fica difícil você jogar em uma posição em que tem que
enfrentar adversárias de 2 metros de altura.
No Brasil também foram surgindo meninas altas e o meu ciclo foi encerrando
naturalmente. Eu realizei um objetivo como profissional que era jogar uma
Olimpíada”.
Ao
falar da seleção, Vânia segue recordando. “O título mais importante que tive
foi o Pan em 1991 em Cuba, minha trajetória na seleção foi essa, cumprindo cada
etapa com o melhor aprendizado, não pulando nenhum tipo de etapa, meu pai
também me orientou e fizemos o que entendíamos ser o certo.”
Irmã gêmea
Ao
se falar de Vânia (à esquerda), não se pode deixar de citar sua irmã Vanira. Além da
semelhança física por serem gêmeas, ambas tiveram destaque pelos clubes por
onde passaram e pela Seleção Brasileira.
Questionada
como era a relação com a irmã nos tempos de quadra, Vânia comenta. “A Vanira,
minha irmã gêmea, que eu amo, uma guerreira também. Uma excelente jogadora de
basquete . Até o time da Prudentina em 1984 e 1985, jogamos juntas, depois nós
entendemos que era melhor nos separarmos. Minha irmã era uma excelente
jogadora, tinha o espaço dela e eu tinha o meu. Ela foi para Sorocaba e eu para
Piracicaba. Era difícil, os pais divididos, as torcidas divididas. Você quer sempre ver a sua irmã jogar bem,
mas você tem defender a sua equipe e ter o profissionalismo acima de tudo”,
explica.
Vânia
segue falando da relação com Vanira. “Eu ficava muito feliz quando minha irmã
jogava, mas eu odiava ter que marcá-la, apesar de ser difícil, mas chegou a
acontecer, mas o profissionalismo vinha antes de tudo. Tenho uma relação muito
boa com a minha irmã, nós somos parceiras profissionais, somos companheiras e
essa garra toda que nós tínhamos dentro das quadras para jogar,nós temos para
viver”.
As
irmãs Hernandes, após a aposentadoria das quadras , iniciaram em 2000 o Centro
de Formação Vânia e Vanira. “Minha irmã é uma parceira, inclusive nossa escolinha
de basquete começou por uma ideia dela. Ela queria muito montar eu a princípio
era contra, porque não era isso mais o que eu queira, eu queria estudar, sair
um pouco do contexto esporte de forma direta, mas é uma relação legal”.
Voltando
a falar da relação de ambas no período em que jogavam, Vânia comenta sobre
inconveniências. “Já cheguei até a ouvir que eu passava esquema de jogo pra
ela, uns absurdos que a gente tinha que ouvir, coisas de pessoas que não tinham
a menor noção do que estavam falando. Não pensavam antes de falar. Sempre
tivemos uma relação muito próxima, muito respeitosa. Cada uma na sua equipe,
tínhamos opiniões diferentes quanto ao trabalho das nossas equipes, mas a
estratégia era não falar sobre”.
Por
todo o contexto, comparações entre o estilo de jogo de ambas ocorriam. Vânia
explica como as irmãs lidavam com isso. “Quando nós estávamos em espaços comuns
e alguém vinha falar que uma jogava melhor do que a outra, que o time de
Piracicaba é melhor do que o de Sorocaba, nós saíamos de perto e deixávamos a
pessoa falando sozinha. Acho que nós administramos bem a nossa vida profissional
jogando por equipes diferentes”
Depois
de anos atuando em equipes diferentes, em 1991, as Hernandes voltaram a jogar
por um mesmo clube. Em 91 eu vim para Sorocaba (atuou no Constecca/Sedox). Finalmente
aceitei o convite, minha irmã foi uma grande influenciadora para que isso
pudesse acontecer e jogamos juntas. Foram dois anos maravilhosos. Fui muito
feliz, morei com a minha irmã e junto com a minha família. Foi um momento bem
bacana na nossa vida”.
Legado
Questionada
sobre o que representa o basquete em sua vida, Vânia diz. “Eu sempre penso que
vivemos momentos em nossa vida. Ser atleta foi um ciclo da minha vida que eu
aproveitei bem, curti muito, me dediquei muito. O basquete me ensinou muito,
principalmente no que tange a questão de comportamento, de dedicação, de
comprometimento, de respeito às pessoas,
não só as adversárias, as pessoas que você não conhece, mas as pessoas
próximas, pois na verdade você fica disputando um lugar contra uma companheira que
veste a mesma camisa e isso tem que ser algo muito saudável, muito
profissional, muito justo, sempre da forma correta, honesta”.
Ainda
falando sobre o que representou o esporte em sua vida, a ex-pivô acrescenta. “Eu
tracei um plano quando eu vi que tinha muitas lesões no joelho e vi que iria
parar de jogar, fui estudar, que era já o que eu queria, hoje tenho duas
faculdades, uma de Educação Física e uma de Pedagogia. Tenho duas pós-graduações,
mestrado em Educação Física e estou fazendo doutorado. Lógico que o fato de
você te sido atleta, é um facilitador para você, mas sozinho isso não anda. As
pessoas da nossa geração conhecem a Vânia como uma atleta aguerrida, como uma
menina que dava gancho,que marcava muito, que corria, não desistia nunca, então
eu sempre usei o basquete ao meu favor, mas sempre tive que batalhar muito, na
faculdade para ter boas notas para poder ganhar uma bolsa, ralar, estudar
muito”, revela.
A
carreira construída até hoje “abre portas” de acordo com Vânia. “Tive que fazer
o meu mestrado com a Dra. Regina Brandão, ir lá estudar, passar por todo o
processo que todo mundo passou para poder estar lá, mesma coisa com o
doutorado, mas é claro que quando vou fazer uma pesquisa, algum trabalho
voltado aos meus estudos, o fato de eu ter sido uma atleta de alto rendimento
me facilita o ingresso, o recebimento por outros atletas, as portas abrem,
então é legal nesse sentido”.
Vânia
segue falando dos benefícios e dissabores do esporte em sua vida. “O basquete
me trouxe muita felicidade, momentos únicos. Eu conheci o mundo através do
basquete e para mim também foi cultura, trabalho, diversão, estresse, tristeza,
quando perdia, uma história de vida.
Conselho
A
ex-pivô que além de possuir um Centro de Formação ao lado de sua irmã Vanira, é
professora em um colégio da cidade de Sorocaba e também em uma universidade do
mesmo município, aconselha. “Você primeiro tem que fazer porque gosta. Fazer
almejando status social, financeiro, talvez isso seja um tombo muito grande. Não
pule etapas, não vá buscando status, busque conhecimento, aprendizado. Já vi
muito nessa minha vida atletas que até tem algum talento que poderia ter sido
lapidado e vai para determinados lugares volta e desiste porque aconteceu isso
ou aquilo”.
Ainda
aconselhando, Vânia fala das mudanças de épocas. “O esporte hoje é bem
diferente da nossa época, você tem as redes sociais, grandes ídolos que de
certa forma conseguem fazer com que a sua imaginação vá a ‘milhão’, são influenciadores de certa forma. Tem que ver se gosta, o técnico ser sincero se
tem talento ou não, dar oportunidade de crescimento”.
O
crescimento, segundo a professora, só acontece Por meio do jogo. “É através do jogo
que você aprende não só a cancha do jogo, mas também a vivência. Você sai da
sua cidade, conhece outras pessoas, passa a saber a hora de falar, de ouvir, o
comportamento ao ser vaiado, passa a ver se é o que você gosta,e se for isso, se dedique, treine, cuide de você, da sua
carreira, não se deixe influenciar. Isso depende muito com quem você está trabalhando”.
O
relacionamento familiar e assimilar os conselhos são pontos fundamentais de
acordo com Hernandes. “O diálogo com os pais, com os técnicos, professores, a
gente tem que ouvir. Siga seu caminho de maneira correta, sem ficar ‘viajando
na ideia’, vamos fazer com que essa ideia, esse objetivo se concretize.
Metas
Com
uma carreira de destaque dentro de quadra e diversos projetos fora dela, Vânia
fala de seus objetivos de vida aos 56 anos de idade. “Meu objetivo de vida é
concluir o doutorado que não é fácil, e está sendo para mim maravilhoso
conhecer pessoas novas, pessoas do esporte, poder ir a eventos acadêmicos. Hoje
o objetivo também é viver um dia após o outro, ser feliz com minha família,
meus amigos, na minha casa, estudar, trabalhar, me cuidar para que as 15
cirurgias que tenho no joelho não sejam um limitador na minha vida e isso eu
tenho feito. Meu objetivo é viver, sou muito grata”.
Gratidão
Ao
falar em gratidão, Vânia aproveita para deixar uma mensagem aos fãs de
basquete.“Obrigada por vocês apoiarem o basquete, aqueles com pouquinho mais de
idade que acompanharam a nossa geração, muito obrigada pelo carinho. Tenho
muitos amigos que fiz no esporte, tenho fãs, pessoas que viveram essa época,
que nos procuram através do Facebook e conversam”.
A
ex-atleta explica ainda que sempre procura dar o máximo de atenção que pode.
“Eu atendo na medida do possível, eu gosto de atender, se não atendo mais,
infelizmente é porque não tenho tanto tempo, mas eu agradeço essas pessoas,
pois são elas que criam, que apoiam, motivam a gente”.
Vânia aborda também o trabalho atual da
Seleção Brasileira. “ Hoje temos uma seleção em renovação, com um técnico novo
(José Neto), vi alguns jogos no Pan-Americano de Lima, na Copa América, vi um
bom trabalho sendo realizado com as meninas. Não conheço o trabalho, mas a
gente pode ver parte desse resultado na quadra, nas posturas defensivas, no
ataque, no jogo coletivo”.
Hernandes
segue falando sobre a seleção atual. “No meu entender, o Brasil não tem uma
atleta como tínhamos em nossa época que brilhavam, jogávamos em função delas,
mas não deixávamos de jogar, que era a Paula e a Hortência. Hoje, temos um
trabalho que tem que ser feito em equipe e é isso que tenho observado. Um
trabalho em equipe, em que todas jogam, os pontos são divididos”.
Voltando
a falar sobre os fãs, Vânia conclui. “Peço aos fãs para que não desistam do basquete, que continuem a nos apoiar,
apoiar o basquete, Eu amo o basquete, não é porque não participo muito, que não vou aos jogos, que deixei de ter amor.
Sou muito grata ao basquete, a todos os fãs que nos acompanharam e ainda se
deslocam aos ginásios, que torcem pela Seleção Brasileira Masculina e Feminina.
O meu muito obrigada e vamos torcer pelo Brasil. Eu também sou uma torcedora.
Um beijo a todos vocês”.
Fotos- Divulgação/Erick Pinheiro-Arquivo Jornal Cruzeiro
do Sul
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